Transtorno Bipolar na Mulher

Denise Mendes

Nas últimas décadas, o estudo das diferenças fisiológicas e patológicas entre mulheres e homens tem sido reconhecido como fundamental para a compreensão geral dos diversos tipos de adoecimento, inclusive o mental, e para a orientação de seu tratamento. Além do dimorfismo sexual, é preciso levar em conta o fato de que mulheres e homens têm, culturalmente, experiências diferentes de vida e apresentam, possivelmente, respostas diferentes a situações estressantes (Leibenluft, 1996b). Longe de alicerçar preconceitos relativos a papéis sociais, a constatação de que o psiquismo – sadio e patológico – apresenta características específicas para mulheres e homens é imprescindível para o desenvolvimento de opções terapêuticas com mais chances de sucesso.

Entre os transtornos psiquiátricos, existe menor quantidade de estudos sobre mulheres com transtorno afetivo bipolar (TAB) do que com transtorno depressivo unipolar ou esquizofrenia (Leibenluft, 1996a; Hendrick et al., 2000). Embora mulheres e homens apresentem prevalências semelhantes para o transtorno bipolar do tipo I, parecem existir diferenças entre os sexos quanto ao curso da doença. Mulheres têm risco maior de desenvolver ciclagem rápida caracterizada por quatro ou mais episódios afetivos em um ano (Leibenluft, 1996a) e, possivelmente, mania mista, além de maior número de episódios depressivos e episódios depressivos mais longos. Também parece haver risco maior de início tardio da doença, entre 45 e 49 anos, para as mulheres (Leibenluft, 1996a; Arnold, 2003).

Essa propensão maior para apresentações do transtorno bipolar com sintomatologia depressiva poderia refletir uma característica específica da diátese depressiva em mulheres (Leibenluft, 1996a; Arnold, 2003). Essa diátese, no transtorno depressivo unipolar e no transtorno bipolar tipo II, contribuiria para o fato de que, nessas duas doenças, as mulheres representem aproximadamente o dobro dos casos dos homens (Dunner, 1998).

A presença mais freqüente de sintomas/episódios depressivos seria responsável, pelo menos em parte, pelo uso maior de antidepressivos por mulheres (Leibenluft, 1996a), muitas vezes sem a utilização simultânea de estabilizador do humor, o que poderia contribuir para um risco maior de episódios maníacos induzidos por antidepressivos e para a ciclagem rápida (Arnold, 2003). Mulheres seguem com o diagnóstico errado de depressão unipolar por aproximadamente dois anos mais que os homens e iniciam tratamento de manutenção com lítio 5,5 anos mais tarde (Arnold, 2003). Quanto a um possível número maior de episódios depressivos – em comparação com um maior número de episódios maníacos em homens, os estudos ainda são contraditórios (Leibenluft, 1996a; Burt e Rasgon, 2004).

Além dos vieses relativos ao tamanho pequeno das amostras e ao caráter retrospectivo dos estudos, a maioria das investigações sobre diferenças sexuais no TAB avalia populações de centros universitários terciários ou de clínicas especializadas em transtornos do humor. Assim, para obter resultados mais representativos da população geral acerca da fenomenologia do TAB em mulheres e homens, um estudo recente descreveu as características de todos os pacientes admitidos pela primeira vez para internação ou tratamento ambulatorial com o diagnóstico de episódio maníaco/transtorno bipolar, na Dinamarca, de 1994 a 2002 (Kessing, 2004). O autor concluiu que, a não ser por uma freqüência maior de comorbidade com abuso de substâncias entre os homens atendidos ambulatorialmente e um número maior de mulheres internadas com episódios mistos, houve pouca diferença nas apresentações do TAB entre os sexos.

Material e métodos

Ciclagem rápida

A diferença de apresentação entre os sexos mais consistente, apesar de a maioria dos estudos serem retrospectivos e com amostras pequenas, diz respeito ao risco de desenvolver, ao longo do curso da doença e geralmente de forma transitória, fases de ciclagem rápida (Leibenluft, 1996a; Yonkers et al., 2004). A ciclagem rápida está presente em 15% a 20% dos pacientes com TAB que se apresentam para tratamento e as mulheres respondem por 58% a 92% dos cicladores rápidos, com média de 71% (Arnold, 2003). Além do prejuízo funcional grave que a ciclagem rápida pode causar (Arnold, 2003), sua presença tem implicações terapêuticas importantes, uma vez que de 72% a 82% dos cicladores rápidos respondem pouco ao lítio. Episódios depressivos na ciclagem rápida também parecem responder menos ao lítio, ao valproato e à carbamazepina do que os episódios maníacos (Arnold, 2003). Outro fator que poderia contribuir para a freqüência maior de ciclagem rápida seria o risco aumentado de hipotireoidismo em mulheres, porém os estudos a esse respeito ainda são contraditórios (Arnold et al., 2000). Uma metanálise (Tondo e Baldessarini, 1998), apesar de confirmar a maior proporção de cicladores rápidos entre as mulheres, chama a atenção para o fato de que essa diferença pode ser apenas moderada e inconsistente entre os estudos. Essa mesma metanálise não encontrou diferença na freqüência de ciclagem rápida entre mulheres e homens antes e durante o tratamento de manutenção com lítio.

Mania mista

A prevalência maior de quadros mistos em mulheres parece variar de acordo com a própria definição de mania mista. Quanto mais estritos os critérios para um episódio misto, mais as diferenças entre os sexos aparecem. Numa revisão de estudos sobre mania mista (Arnold et al., 2000), aqueles que adotaram como definição a presença de uma síndrome depressiva, e não só de alguns sintomas depressivos, acompanhando a mania, mostraram uma relação mulher/homem de aproximadamente 1,9:1, enquanto naqueles com critérios intermediários (alguns sintomas depressivos) a relação caiu para 1,8:1 e, nos com critérios menos rígidos (qualquer sintoma depressivo), para 0,6:1. Episódios de mania mista respondem melhor ao valproato e à carbamazepina do que ao lítio, independentemente do sexo (Arnold, 2003).

Transtorno bipolar tipo II

Um estudo de uma série de 557 casos de mulheres e homens com transtorno bipolar tipo II e depressão unipolar confirmou a relação de prevalência mulher/homem de aproximadamente 2:1 e encontrou mais características atípicas nos episódios depressivos em mulheres (Benazzi, 1999).
Ciclo reprodutivo

A relação entre sintomas afetivos e o ciclo menstrual em mulheres com transtorno bipolar ainda não está esclarecida (Leibenluft, 1996a e 2001; Rasgon et al., 2003), assim como a influência da puberdade, da gravidez e da menopausa.

A gravidez não representa proteção contra doenças mentais ou aumenta seu risco (Arnold, 2003). Existe um risco aumentado de episódios de humor no puerpério e, na verdade, em nenhuma outra época ocorre risco maior, sobretudo se há história de episódios puerperais prévios (Leibenluft, 1996a).

Faltam informações sobre os efeitos dos hormônios sexuais exógenos no curso do transtorno bipolar, embora alguns estudos descrevam um possível efeito estabilizador do humor no tratamento de pacientes com transtorno bipolar refratário (Leibenluft, 1996a; Rasgon et al., 2003).

Evolução e comorbidade

Um estudo relatou diferenças subjetivas de bem-estar e funcionamento geral entre mulheres e homens com transtorno bipolar e levantou a hipótese de um curso mais nocivo ou sintomático da doença em mulheres (Robb et al., 1998). Outro estudo, voltado para diferenças no curso da doença, acompanhou variações de humor de 35 homens e 45 mulheres com o diagnóstico de TAB ao longo de três meses. As mulheres relataram mais sintomas depressivos e maiores flutuações do humor do que os homens, e aquelas em idade reprodutiva apresentaram mudanças de humor de acordo com a fase do ciclo menstrual, sem que, contudo, ficasse estabelecido um padrão para essas mudanças (Rasgon et al., 2005).

Um estudo sugeriu que mulheres com TAB teriam mais transtornos ligados ao consumo de álcool e outras drogas do que mulheres na população geral (Hendrick et al., 2000). Haveria ainda maior comorbidade com transtornos de ansiedade – em particular, transtorno do pânico – transtornos alimentares, obesidade e enxaqueca.

O risco de suicídio é semelhante para homens e mulheres com TAB e aumenta para ambos na presença de mania mista (Arnold, 2003).

Aspectos gerais do tratamento do TAB em mulheres

Os estudos sobre resposta ao tratamento são escassos, mas aparentemente não há diferenças entre os sexos (Arnold, 2003). Uma metanálise de 17 estudos sobre o tratamento do TAB com lítio não demonstrou diferença de resposta entre mulheres e homens, apesar da freqüência maior de ciclagem rápida entre as mulheres (Viguera et al., 2000).O impacto do risco aumentado de ciclagem rápida e de mania mista em mulheres ainda é controverso na escolha do estabilizador de humor, não estando claro até que ponto ele justificaria os anticonvulsivantes como medicações de primeira escolha (Burt e Rasgon, 2004). Entretanto, especificamente para a mania mista, a Associação Americana de Psiquiatria recomenda preferencialmente o uso de valproato, ficando, no caso da ciclagem rápida, a escolha entre monoterapia com lítio ou valproato (American Psychiatric Association, 2002).

A carbamazepina e o topiramato reduzem os níveis de anticoncepcionais orais (Arnold, 2003), que, por sua vez, reduzem os de lamotrigina. Lítio, valproato, gabapentina e antipsicóticos atípicos não interferem nos níveis de anticoncepcionais orais. O valproato parece estar associado ao aparecimento de alterações na função reprodutiva da mulher e existe a necessidade de monitoração de irregularidade menstrual, obesidade e hirsutismo em mulheres em tratamento com esse medicamento (Leibenluft, 2001; O’Donovan et al., 2002; Arnold, 2003). Ainda não é certo se a freqüência aumentada da síndrome dos ovários policísticos é uma condição específica do tratamento com valproato ou do próprio transtorno psiquiátrico (Burt e Rasgon, 2004). De qualquer modo, mulheres com TAB apresentam uma freqüência maior de anormalidades menstruais ao longo da vida, independentemente da medicação (O’Donovan et al., 2002).

Na população geral, as mulheres têm maior freqüência de anticorpos antitireoidianos, tireoidite autoimune e hipotireoidismo (Leibenluft, 1996a). Mulheres apresentam maior sensibilidade aos efeitos tireotóxicos do lítio (Leibenluft, 1996a e 2001) e a freqüência de hipotireoidismo associado ao lítio é de 14% em mulheres contra 5,5% em homens (Burt e Rasgon, 2004). A autoimunidade tireoidiana e a exposição ao lítio representariam, portanto, riscos cumulativos para o hipotireoidismo em mulheres (Arnold, 2003).

Tratamento na gravidez

O estudo com medicações psiquiátricas durante a gravidez enfrenta problemas metodológicos importantes, sobretudo no que diz respeito à impossibilidade de constituir um grupo controle adequado, o que sempre vai confundir os efeitos dos tratamentos e das doenças (Stowe et al., 2001). Durante a gravidez, a decisão quanto à necessidade de tratamento medicamentoso pode se referir ao acontecimento de um primeiro episódio, de um novo episódio ou à necessidade de tratamento de manutenção para a prevenção de recorrência (Wisner et al., 2004). Além do tratamento medicamentoso, a paciente deverá ser informada sobre a possibilidade de eletroconvulsoterapia, psicoterapia (interpessoal, por exemplo) e, ainda, de não haver nenhum tratamento, a menos que surjam sinais de recorrência ou de agravamento do quadro, com ideação suicida ou sintomas psicóticos. É importante lembrar que, no caso de recorrência, a criança será exposta tanto aos medicamentos quanto à doença materna.

A presença de doença mental sem tratamento durante a gravidez pode ter impacto negativo tanto na evolução obstétrica quanto no desenvolvimento posterior da criança. Os riscos maternos de abuso de substâncias, suicídio, abandono do acompanhamento pré-natal e de nutrição inadequada estão aumentados, representando problemas para o feto, o casal e a prole (Stowe et al., 2001).

Em animais, já foram descritos prejuízos do crescimento, do aprendizado e da aquisição de outros marcos do desenvolvimento, além de alterações do eixo hipotalâmico-hipofisário-adrenal, alterações dos sistemas de neurotransmissão, do sistema imune e prejuízos comportamentais permanentes. Houve ainda prejuízo dos cuidados maternos, com mudanças na interação mãe–filho e no desenvolvimento infantil posterior (Stowe et al., 2001).

O estresse materno pré-natal está associado a peso e idade gestacional baixos ao nascimento (Wadhwa, 1993). Entretanto, os planos de tratamento do transtorno bipolar na gestação não costumam levar em conta o impacto do estresse e de doenças mentais não-tratadas no desenvolvimento fetal e neonatal (Stowe et al., 2001). A exposição pode ser a alterações neuroendócrinas, ao comportamento pré-natal materno, ao meio psicossocial em que o neonato se desenvolve e a efeitos dos tratamentos somáticos. Em resumo, sempre haverá algum tipo de “exposição” do feto: ao tratamento ou à doença materna (Stowe et al., 2001).

De modo geral, os efeitos adversos associados à medicação durante a gravidez dependem das propriedades do medicamento e da fase em que ocorre a exposição fetal: até 32 dias, alterações no desenvolvimento e/ou fechamento do tubo neural; entre 21 e 56 dias, malformação cardíaca; entre 42 e 63 dias, defeitos em lábios e palato. Anomalias craniofaciais também podem ocorrer após o primeiro trimestre, assim como alterações neurocomportamentais (Yonkers et al., 2004).

A decisão quanto à melhor conduta medicamentosa também deverá levar em conta a história prévia do transtorno e a possibilidade de planejamento da gravidez. Em casos mais leves (um episódio maníaco prévio ou períodos longos de estabilidade) pode ser feita a tentativa de descontinuação da medicação, sempre lentamente (Yonkers et al., 2004), antes da concepção. Para quadros moderados, a retirada gradual também poderá ser feita, porém após confirmação precoce da gravidez (duas primeiras semanas, antes do estabelecimento da circulação materno-fetal). Finalmente, em casos graves (quatro ou mais episódios de mania ou depressão, por exemplo), está indicada a continuação do tratamento ao longo da gravidez, de preferência com doses mínimas eficazes e número limitado de medicamentos. Doses insuficientes exporiam a criança tanto ao risco de recaída materna quanto ao medicamento (Burt e Rasgon, 2004). Como, muitas vezes, a gravidez ocorre inesperadamente, seria preciso discutir essa possibilidade e suas implicações para o tratamento com toda paciente com TAB em idade reprodutiva (Yonkers et al., 2004).

Mudanças fisiológicas maternas (aumento do volume plasmático, do metabolismo hepático e da taxa de filtração glomerular) implicam a necessidade de monitoração dos níveis plasmáticos dos medicamentos ao longo da gravidez.

Estabilizadores do humor

Filhos de mulheres em tratamento com lítio estão sujeitos ao risco de 4% a 12% de anomalias congênitas em comparação com o risco de 2% a 4% da prole de mulheres da população geral (Leibenluft, 1996a). Com relação a malformações cardíacas, o risco relativo é de 1,2% a 7,7%. Quando administrado no primeiro trimestre de gravidez, o lítio determina um risco de 0,05% a 0,1% de malformações cardiovasculares, incluindo anomalia de Ebstein, o que representa um risco de 10 a 20 vezes superior ao da população geral (Arnold, 2003), mas, ainda assim, um risco pequeno (Yonkers et al., 2004). Pode ocorrer síndrome do floppybaby (cianose e hipotonicidade) com a exposição ao lítio em fases mais avançadas da gestação (Arnold, 2003).

Durante a gravidez, a taxa de filtração glomerular materna aumenta, havendo diminuição rápida com o parto, o que indica a necessidade de monitoração dos níveis de lítio ao longo da gestação, com possíveis ajustes na dose do medicamento para evitar recaída ou intoxicação (Yonkers et al., 2004).

O risco de espinha bífida com o uso de carbamazepina é de 0,5% a 1%, com risco relativo de 13,7% (Hendrick et al., 2000). Com o valproato, o risco de defeitos do tubo neural é de 5% a 9% (de 1% a 5% para espinha bífida). Mesmo após o primeiro trimestre, o risco de espinha bífida com carbamazepina ou valproato é 15 vezes superior ao da população geral (Arnold, 2003). Esses riscos aumentam com doses mais altas e com a utilização simultânea de mais de um anticonvulsivante.

Existe o risco de toxicidade neonatal com o valproato, caracterizada por desaceleração cardíaca e sintomas de retirada (irritabilidade, inquietação, dificuldade de sucção e alteração do tônus). Também foram descritas toxicidade hepática e hipoglicemia. Para a gestante, há risco de redução dos níveis sangüíneos do valproato por indução da glicuronidação (Yonkers et al., 2004).

Para a prevenção de defeitos do tubo neural, recomenda-se o uso de folato (4 mg/dia, embora não haja consenso sobre a dose ideal) a partir de 4 semanas antes da concepção até a 12ª semana de gestação. Antes de iniciar a suplementação, deverá ser feita dosagem de vitamina B12 para o diagnóstico de possível anemia perniciosa, que pode ser mascarada pela suplementação com folato (Yonkers et al., 2004). Em caso de exposição fetal à carbamazepina ou ao valproato, recomenda-se a administração de 20 mg/dia de vitamina K no último mês de gravidez e 1 mg IM no neonato para a prevenção de sangramento neonatal e de anomalias da parte média do rosto (Yonkers et al., 2004).

No caso de uso de lítio no primeiro trimestre de gravidez, deverão ser realizados ultra-som de alta resolução e ecocardiograma fetal entre a 18ª e a 20ª semana de gravidez para a detecção de anomalias cardíacas. Com o uso de valproato ou carbamazepina, recomenda-se a realização de ultra-som entre a 16ª e a 19ª semanas junto com exame de alfafetoproteína seguidos, na suspeita de espinha bífida e amniocentese (Arnold, 2003). Esses exames são imprescindíveis para a indicação de possíveis intervenções perinatais.

Não há estudos adequados com o topiramato na gravidez e, para o uso de lamotrigina no primeiro trimestre, foi relatada uma freqüência de defeitos congênitos de 1,8% (Ernst e Goldberg, 2002). É importante lembrar que o metabolismo da lamotrigina se dá exclusivamente por glicuronidação, um processo ainda imaturo no feto e no neonato (Yonkers et al., 2004). Nas gestantes, há aumento da depuração renal da lamotrigina, com retorno aos níveis originais após o parto.

Antipsicóticos

O risco de malformações estruturais com antipsicóticos típicos é semelhante ao da população geral. Antipsicóticos típicos podem representar risco menor do que estabilizadores do humor e, por isso, alguns especialistas recomendam o uso desses medicamentos em pacientes sintomáticas durante a gravidez. Por outro lado, antipsicóticos típicos trazem risco maior de hiperprolactinemia, o que pode interferir na fertilidade da paciente (Yonkers et al., 2004).

Um estudo relatando 96 casos de exposição intrauterina à olanzapina encontrou alterações compatíveis com as de controles históricos (Ernst e Goldberg, 2002). Não há estudos com a risperidona ou a ziprasidona. Para a clozapina, foram descritas síndromes perinatais, mas não anomalias congênitas. Recomenda-se a monitoração cuidadosa de ganho de peso, glicemia e pressão arterial para gestantes em uso de olanzapina (Arnold, 2003).

Antidepressivos

Não existem evidências de risco maior de morte intrauterina, malformações físicas ou prejuízo do crescimento com o uso de antidepressivos tricíclicos ou inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS) durante a gravidez. Quanto ao risco de alterações comportamentais ou do neurodesenvolvimento, pelo menos um estudo não mostrou diferenças em crianças expostas a antidepressivos tricíclicos e fluoxetina (Nulman et al., 1997). No período neonatal foram descritos efeitos adversos diretos e síndrome de retirada com o uso de antidepressivos tricíclicos e fluoxetina (Wisner et al., 2000).

Benzodiazepínicos

Estudos de caso-controle relatam risco para lábio leporino ou fenda palatina em crianças expostas a benzodiazepínicos durante a gestação de 11:10.000 nascimentos, um aumento de 80% em comparação com o risco de 6:10.000 na população geral (Yonkers et al., 2004).

Como o tratamento de alterações do sono pode ajudar na profilaxia de recorrências, às vezes é necessária a utilização desses medicamentos durante a gravidez e, nesses casos, parecem estar mais indicados os agentes de alta potência. Deve ser evitado o uso de benzodiazepínicos nas semanas que antecedem o parto pelo risco de síndrome de abstinência no neonato (Yonkers et al., 2004).

Eletroconvulsoterapia

Não há relato de efeitos adversos secundários ao uso de eletronvulsoterapia (ECT) durante a gravidez e seu uso estaria indicado principalmente nos casos de descompensação psicótica ou de ideação suicida (Burt e Rasgon, 2004). A única ressalva em relação à ECT é uma possível necessidade de ajuste do estímulo elétrico porque o limiar de convulsão diminui com o estrogênio e aumenta com a progesterona (Yonkers et al., 2004).

Intervenções psicossociais

Existem poucos estudos sobre os efeitos diretos ou indiretos de intervenções não-farmacológicas no TAB e, mais particularmente, durante a gravidez. Entretanto, estratégias para aumentar a adesão ao tratamento e minimizar a privação do sono podem, teoricamente, contribuir para a diminuição do risco de novos episódios de humor na gestação (Yonkers et al., 2004).

Puerpério

No puerpério, existe um risco aproximadamente sete vezes maior de internação por um primeiro episódio de TAB e duas vezes para a recorrência. De 20% a 30% das pacientes com TAB desenvolvem psicose puerperal (mania, depressão grave ou psicose polimórfica aguda), e, na população geral, um a cada mil nascimentos está associado ao desenvolvimento desse quadro (Brockington, 2004).

A profilaxia com estabilizadores do humor parece reduzir significativamente o risco de novos episódios no puerpério. A interrupção do lítio no puerpério traz um risco três vezes maior de recaída do que quando feita em outra fase da vida. Com a manutenção do medicamento, o risco de recaída cai de aproximadamente 50% para menos de 10% (Yonkers et al., 2004).

Um estudo não conseguiu demonstrar diferenças significativas entre o uso de valproato associado à monitoração dos sintomas e apenas a monitoração na recorrência de episódios de humor no puerpério de 26 mulheres com TAB (Wisner et al., 2004). Esse estudo sugere que o tratamento farmacológico mais prudente no puerpério seria a manutenção da medicação com a qual a paciente houvesse respondido previamente e um plano de potencialização no caso de surgirem os primeiros sintomas de descompensação.

Tratamento e amamentação

A consideração mais importante na opção pela amamentação deverá ser a saúde materna, uma vez que não há medicação psicotrópica absolutamente segura para o lactente (Arnold, 2003). Outro aspecto relevante é o risco de descompensação do TAB por conta da privação do sono que ocorre na época da amamentação.

Em caso de tratamento medicamentoso, recomenda-se a administração dos medicamentos imediatamente após a amamentação ou antes de um período de sono prolongado da criança (Arnold, 2003).

Estabilizadores do humor

A concentração do lítio em lactentes varia de 10% a 50% da concentração materna e o uso dessa medicação é contra-indicado pela Associação Pediátrica Americana (APA) em razão do risco de intoxicação associado, inclusive, com a facilidade com que os lactentes se desidratam (Arnold, 2003).

A carbamazepina (15% a 65% da concentração materna) e o valproato (0,9% a 40% da concentração materna) são classificados pela APA como compatíveis com a amamentação. Não há relatos de efeitos adversos com a lamotrigina (25% a 30% da concentração materna) (Burt e Rasgon, 2004).

É preciso lembrar, no uso de anticonvulsivantes, que prematuridade ou outros problemas clínicos da criança podem estar associados a metabolismo hepático imaturo.

Antipsicóticos

Não se sabe se a olanzapina e a risperidona são excretadas no leite materno. Com a clozapina, existem relatos de sedação, dificuldades de sucção, inquietação ou irritabilidade, convulsões e instabilidade cardiovascular em lactentes. De modo geral, os laboratórios não recomendam a amamentação no uso desses medicamentos, recomendação que se estende aos antipsicóticos típicos (Llwellyn e Stowe, 1998).

Conclusões

Existem relativamente poucos estudos sobre as peculiaridades do tratamento do transtorno bipolar na mulher e muitos dos estudos a respeito de diferenças na fenomenologia desse transtorno trazem resultados contraditórios (Burt e Rasgon, 2004). Apesar disso, diante do risco provavelmente aumentado de ciclagem rápida e de mania mista, uma boa estratégia de prevenção foi resumida por Leibenluft (1997) na sugestão de maximização do uso de estabilizadores do humor e minimização do uso de antidepressivos em mulheres com TAB.

A utilização de medicamentos durante a gravidez e a amamentação exige do clínico a avaliação da relação custo–benefício, uma vez que os riscos para o feto dizem respeito tanto à exposição ao medicamento quanto à doença materna. De modo geral, a história psiquiátrica prévia da gestante e a possibilidade de planejamento da gravidez podem ajudar na escolha da conduta.

Mais estudos – prospectivos, com amostras maiores e que não se restrinjam a populações de centros especializados – são necessários para o esclarecimento de possíveis diferenças no curso do TAB e na resposta aos tratamentos entre mulheres e homens.

1 comentários :

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Anônimo
admin
26 de outubro de 2009 às 22:08 ×

Parabéns pelo post. Muito interessante separar o sexos, explorar e evidenciar as fases da mulher x bipolaridade. Na minha "humilde" opinião eu penso que as mulheres ciclam mais... Parece que o texto foi muito feliz em evidenciar isso.

Congrats bro Anônimo you got PERTAMAX...! hehehehe...
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